alhos & bugalhos De Domingo
lEITURA
DO DIA
A Coleção Invisível
Caros Companheiros:
É com uma imensa satisfação que podemos anunciar que nosso filme
vai estrear no mês de setembro no circuito comercial. Desde a estréia no
Festival do Rio, participamos da Mostra Internacional de São Paulo, do Festival
de Havana e ganhamos Premio de Melhor Filme no Festival Internacional de Lisboa
e estaremos participando da Seleção Oficial do Festival de Gramado na
próxima semana.
O caminho para chegar à distribuição foi difícil como sempre é
para os filmes nacionais. Afortunadamente
Andre Sturm se D e fechamos um acordo com a Pandora Filmes,
liderada hoje por Barbara Sturm.
Decidimos assim encarar este desafio impulsionados pela boa
receptividade que tivemos da imprensa e dos críticos e ainda com os poucos
recursos que temos para investir decidimos sair na conquista de um público que
sabemos vai valorizar a mensagem humana que o filme carrega e que fez com que
todos nos juntássemos para construirmos este filme que muito me orgulha.
Aproveito pra anunciar que teremos pré-estréia na Praça Publica de
Itajuípe no dia 24/8 e no Cinema Itau-Glauber em Salvador no dia 29/8, e que a
presença de todos será muito importante nesses dias. Logo estaremos nos
comunicando para enviar os convites.
Por enquanto peço a todos que comecemos a divulgar o filme
nas redes sociais que é nossa melhor arma.
- pedir a seus amigos e sua família de curti-la.
Nossa gravação terminou quase trinta meses atrás. Do roteiro até a
finalização do filme, dos pesquisadores até os produtores do lançamento, mais
de quinhentas pessoas trabalharam nesse filme. Quando lembro dessas etapas e da
dedicação de cada um, me bate uma saudade enorme. Lançar um filme no Brasil é
desafiador mas não podemos deixar nossos esforços morrer na praia.
Seja do Rio, de São Paulo, de Salvador ou da Região Cacaueira,
vamos lá: divulgar nosso trabalho lindo e fazer que nossa "Coleção
Invisível" seja visível para o maior número possível de pessoas.
Adriana Calcanhotto
Visita
Meu
pai e eu fomos ficando mais iguais à medida que nos tornamos cada vez mais
diferentes?
Acompanho
o movimento das mãos, elegantes, másculas, de unhas bem lixadas, redondas nos
cantos. Não são mais as mesmas, têm marcas que não conhecia e parece que agora
se movem com menos precisão. Arriscaria dizer que tremeram levemente quando
folheando as páginas dos cadernos, que eu não sabia que existiam. São oito ou
dez cadernos pequenos, empilhados na mesa de centro da sala. Ele aponta e me
diz “se quiser saber quem sou, está tudo aqui”.
Nunca
soube que ele tivesse cadernos, nunca vi cadernos antes, em nenhuma das casas
onde morou, ou moramos. Nos escritórios, no meio das baquetas, dos papéis de
desenho, dos instrumentos musicais, das revistas de arquitetura, nunca vi
cadernos. Mas achei engraçado, diz que está tudo ali, embora não encontre o que
quer que seja que procura, caderno por caderno, folha por folha. Engraçado
porque também tenho uns dez cadernos, que comprei ou ganhei, empilhados, na
bancada. Mas nos meus não há nada escrito. Não escrevi. Por não saber o que
dizer, com certeza. Ou como. Ou talvez por saber o que dizer e preferir não
dizê-lo. O silêncio sempre é menos precário. Com o que encher dez cadernos
pequenos? Com pontos de interrogação no final de períodos curtos? Dez cadernos
vazios não seriam mais úteis do que cheios?
Ele
não parece ter essas dúvidas, o meu pai. Sabe que está nos cadernos, conforme
anunciou. Só não encontra o que procura. Exatamente o que aconteceria comigo,
caso tivesse escrito. Por isso é que não me dei ao trabalho de escrever,
imagino. Espero, paciente e curiosa. Ganho tempo enquanto ele folheia tudo
novamente, agora de trás pra frente. Tempo para assimilar a surpresa de saber
que ele tem cadernos. E que anota coisas, diferentemente de mim, que tenho a
mesma pilha de cadernos, em branco.
Como
podemos continuar tão iguais e tão diferentes? Fomos ficando mais iguais à
medida que nos tornamos cada vez mais diferentes? Ou não faz diferença se
escrevemos ou não, já que na hora de ler não se vai encontrar nada mesmo? Nisso
somos idênticos. Quem sabe ele não escreveu aquilo que está procurando? Isto é
o mais provável. Está, se me conheço, porque o conheço, procurando o que não
há, independentemente de quem o tenha escrito, se é que foi escrito. Se é que
seria possível escrever isso que ele procura, e não encontra.
Finalmente
as mãos me passam um dos cadernos, aberto, com a caligrafia que não é igual ao
que era, mas que eu reconheceria a centenas de milhas daqui, e diz: “olha
isso”. A letra de um samba. Não foi ele quem escreveu, apenas copiou ou anotou
pra não esquecer. Um samba-enredo que tem uma letra ridícula porque precisa
enfiar o tema à força nos versos, por causa de patrocínio para o desfile da
escola. O que talvez pudéssemos chamar de o samba-enredo menos inspirado do
mundo.
Obviamente
não era isso que ele procurava, mas rimos mesmo assim. Fica claro que não
encontrou o que queria me mostrar, o mesmo que aconteceria comigo. Desconfio
que só quisesse, afinal, me fazer saber que tem cadernos e que ali se encontra,
embora não pareça, assim, à primeira vista. Tem cadernos, caso eu queira saber
quem ele é. Nos abraçamos, o tempo está fechando, vai chover, e preciso pegar a
estrada de volta. Escrito no Jornal O Globo
VOU BATER O MARTELO... PONTO
FINAL. (REDAÇÃO: O BOLSO DO ALFAIATE)
g
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